quinta-feira, 1 de outubro de 2009
PARA MEU AMIGO PILOTO
O CAÇADOR DOS VENTOS
Quando volto o olhar ao passado,contado e recontado nas histórias dos amigos,nas histórias da família e por ele mesmo muitas vezes,reconheço o menino que reinava pelo “Morro das Piteiras” soltando pipas e, pelas proibidas e traiçoeiras águas da “Passagem”: livre “menino passarinho”,com vontade, mesmo, era de voar.
Por isso deitava-se na relva com amigos e fitava o céu enxergando, nele,através de viagens sem ópios (como já foram um dia as verdadeiras viagens das crianças),estranhas figuras formadas no céu pelo imaginário de um piloto em potencial que,logo, logo,sem que ele próprio soubesse, caçaria ventos pelos céus de seu Brasil.Refastelado ali,no meio do mato,provavelmente cercado de carrapatos e grilos, adormecia e sonhava um pequeno futuro coronel do ar.
E como “todo menino é um rei”,este soldadinho, em seu reino,voava através daquelas coloridas pipas que “pilotava” pelos céus de uma cidade do interior,como se fossem os caças do futuro, através dos quais rasgaria outros difíceis e temerosos céus.Cada movimento das pipas, linha sob o comando de sua mão,eram piruetas,exibições,perigosas manobras,projetadas na imaginação de quem já sabia o que desejava na vida:voar,e voar livre, como tico-ticos,canários,sabiás e aviões de caça.Ali, aconteceram seus primeiros treinos e preparações.Ali ,tirou seu primeiro brevê de moleque.Ali, se iniciava a brilhante carreira daquele que se tornaria um profissional do ar, um grande CAÇADOR DE VENTOS.
Anos depois de tudo isso não poderia ser compreensível para nenhuma cabeça pensante,que o feliz “menino passarinho” já voador,pudesse suportar as panes que a surpresa dos ventos lhe preparou.
Na profissão de piloto o que sempre soube bastava: um avião é uma aeronave mais pesada que o ar mas que se sustenta por meios próprios.E ele apenas precisava de uma área plana e livre(como aquela dos sonhos),para alcançar a velocidade necessária para decolar, alçar voo e se sustentar no céu.Caçador que sempre foi,pilotou aviões,com toda a tranquilidade e certeza de estar,ainda,deitado, sob o céu de uma cidade do interior, caçando apenas o vento.
Pilotando a vida,como acontece com todos,pilotos e passageiros,o que sempre soube não bastou:de repente, já não havia áreas planas para as decolagens, nem sua aeronave conseguia se sustentar no céu por meios próprios.As rotas se tornaram difíceis de serem obedecidas e, plainar passou a ser a solução inteligente do piloto.Apesar de tudo,o guerreiro,treinado para combates aéreos,iniciou seu processo solitário de luta,driblando,entre decolagens e pousos perigosos e, entre arriscadas manobras,o mais forte inimigo de sua guerra pessoal: a doença que o tiraria de combate.
Para quem não sabe,um piloto de caça tem características que o tornam individualmente distinto.Primeiramente ele dá tudo de si naquilo que faz.Como oficial brilhante,foi o que fez diante da constatação de seu espaço aéreo invadido.Em sua central de comandos,checando possibilidades,lúcido e inteligente,não teve dúvida:havia recebido uma missão e a cumpriria, apesar do risco maior de ser abatido,como foi.
Hoje,há exatos sete dias que nosso menino-piloto rompeu todas as barreiras do som,nós,parentes e amigos que ficamos tantas vezes impotentes no’ hangar’ testemunhando sua luta,mesmo lamentando por sua ausência tão precoce,continuaremos,certamente, com o olhar fixo no horizonte,”lá onde é o longe”,lá, onde, para sempre,nossos corações com os olhos de criança (como ele pode ter),enxergaremos seus rastros deixados nos céus.Além da velocidade da luz,além da velocidade do som,lá, eternamente, estará ele: o moleque de Valença,nosso menino passarinho,certamente agora,mais do que nunca,ainda com muita vontade de voar.
Para meu amigo/irmão Celion Robert de Almeida Araújo,
com amor.
Jô.
Valença,28 de maio de 2009
Jocely Aparecida Macedo da Rocha.
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