“ BOAS LEMBRANÇAS “
Todos os anos,ao término da Festa de NOSSA Senhora da Glória,sou tomada por dois sentimentos antagônicos e complementares: nostalgia e euforia, já pela expectativa do próximo ano.Exagero?Bairrismo?Religiosidade?Pode ser,principalmente, sendo eu, filha de Jurema que,para quem não sabe, mesmo já bem idosa,atravessava a multidão, balançando o corpo e com um sorriso abotoado no rosto.Quando se está feliz, o corpo todo demonstra isso e era assim que mamãe ficava, quando a levávamos à Festa.Outro dia, fiz as contas de quantas Festas ela deve ter participado, nesse universo de 171 e concluí, (o que me acalmou o coração tristonho, por não poder mais vê-la feliz daquele jeito ),que, em pelo menos umas oitenta,ela pôde dar o seu “ar da graça” nas novenas,no leilão,nas barraquinhas e,com certeza,com aquele sorriso abotoado.E ela teve foi sorte, porque papai, também, era festeiro.Talvez, por isso mesmo, é que,durante tantos anos, foi o
responsável,junto com o Sr Reginaldo Ramos (avô do Niltinho dentista),pela organização dessa Festa,alíás o que fazia muito bem feito e com muita alegria e doação.Ele era assim:todo doação,sempre com boa vontade.Era só não pisar no calo dele,” que nem eu “.
Mas a Festa da Padroeira sempre me traz lembranças muito boas.Sou do tempo da “ Vovó Silvéria “ (vovó verdadeira do dentista Pedro Iório),a velhinha mais engraçadinha de Valença,antes da mamãe virar também velhinha.Vovó Silvéria carregava uma bolsinha, cujo conteúdo era a nossa alegria: balinhas de guaco.Coisa boa demais!!!!Até hoje, a Festa,para mim,tem esse sabor.Sou do tempo do cavalinho de pau do “Seu Natan”, do Parque do “Seu Mário”(para quem não sabe,pai da Última,Osmar,Aurismar,Myrna e mais um irmão de quem não lembro o nome), e do cavalinho de bichinhos variados(feitos no quintal da minha casa, na Vila Ferroviária) do “Seu Carlinhos”,meu pai.No meu tempo, tinha, ainda, o ilusionismo da cabeça sem corpo e da mulher gorila.Tudo era um jogo de espelhos,nos diziam os espertos adultos.Na verdade, nem eles sabiam direito o que era o tal do jogo de espelhos.Tinha o horripilante museu de cera, que nos assustava com suas peças chocantes e tinha o ônibus com o peixe que dava choque,um tal de poraquê.No dia 15, o almoço da Festa,sempre em família,sagrado como o almoço de Natal e a missa das 10,também sagrada . À noite,a procissão e o uniforme de gala:boina,sapato canoa,meia fina e lanterninhas de velas, que, quase sempre, pegavam fogo ou que nós,adolescentes,nos deliciávamos com o prazer de queimá-las.Na véspera, os bailes e as roupas novas.E os namorados,com certeza!!!Muitos deles viraram maridos.A Festa era propícia aos bons e maus encontros amorosos.E tudo isso não é saudosismo,é um relato histórico apenas.Agora, saudade mesmo eu tenho é do “iô iô de serragem “... Nunca mais a gente viu nada igual.Plastificaram o nosso iô iô!! Em verdade,acho que até meu coração ficou um pouco plastificado,mistura de tristeza e raiva com tantas ausências,sobretudo, as humanas!!
Mas,de qualquer forma, “Viva NOSSA Senhora da Glória”!!!!Ela é a causa e a conseqüência de tudo,a principal estrela da Festa e a gente se lembra tão pouco disso.Qualquer dia,em qualquer Festa da Glória,talvez eu passe a me lembrar mais dela.Aí, vou encher a bolsa de balinhas de guaco,vou também dançar de alegria, como fazia minha mãe e,debaixo das lâmpadas que meu pai acendia nas barraquinhas,vou me reencontrar com aquela menina e com seu iô iô de serragem.Quem sabe, nesse dia,como num jogo de espelhos, eu também não reaprenda a rezar e me reencontre com tantos amigos perdidos para outras dimensões: aqueles com quem, juntos, e com os olhos etílicos de lágrimas,entoávamos com orgulho o “ilumina-se toda a cidade...”
Valença,13 de agosto de 2007-08-14
Jocely Aparecida Macedo da Rocha
( Jô )